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Capítulo 4 Causas dos problemas nutricionais

4.1. Como se realiza a análise causal?

Antes de uma intervenção nutricional, educativa ou de outro tipo, é indispensável determinar as causas do problema que se identificou. Desde há algum tempo, é reconhecido que a análise causal é necessária para o desenho e implementação de programas bem sucedidos de educação nutricional. Isto se deve a que os problemas nutricionais são o resultado da interação de numerosos e complexos fatores sócio-econômicos, biológicos e ambientais, e não de um deles isoladamente.

Beghin et al. definiram um procedimento para a análise dos fatores que influem no estado nutricional (relativo ao problema específico identificado). O resultado desta análise é apresentado num esquema em forma de árvore, cujos ramos conduzem o leitor desde as causas mais próximas até as mais distantes. É uma rede que mostra os fatores diretos e indiretos que afetam o estado nutricional da população (Ver figuras 1,2 e 3).

As etapas do processo de análise causal são as seguintes:

  1. Constituição de uma equipe interdisciplinar e intersetorial, que inclua representantes da população implicada. Este grupo pode ser o mesmo que a Comissão de Planejamento do projeto de intervenção. Também pode ser mais amplo, mas nesse caso deverá incluir todos os membros da Comissão de Planejamento.

  2. Uma vez reunidos, os membros do grupo deverão estabelecer uma lista dos fatores conhecidos ou que se presume afetam o estado nutricional da população alvo da intervenção (exemplos: os fatores que afetam o estado nutricional das crianças de 6 a 36 meses; os fatores que contribuem para produzir anemia nas gestantes).

  3. O grupo construirá uma cadeia de causalidade, unindo os fatores relacionados de forma progressiva, e organizando-os hierarquicamente, de tal maneira que resultem em uma rede de fatores que afetam o estado nutricional. Esta rede é um modelo hipotético que poderá evoluir durante a preparação e execução do programa.

  4. Neste modelo, o grupo identificará os fatores sobre os quais parece oportuno atuar. A escolha é feita em função de critérios definidos pelo grupo (por exemplo: a factibilidade, a aceitação, a presumível eficácia, o custo, as exigências dos patrocinadores e outros).

  5. Entre esses fatores, o grupo identificará aqueles que são suscetíveis de abordar com uma intervenção educativa: isto é, os fatores vinculados, pelo menos parcialmente, à conduta humana.

Este será o enfoque educativo que se apresentará mais adiante. Encontra-se informação mais detalhada nos trabalhos de Andrien e Beghin (Ver referências).

Um exemplo de análise causal

Em 1990, o serviço de luta contra a má nutrição do Ministério de Saúde Pública de Marrocos realizou uma análise causal prévia à implantação de um programa de comunicação em nutrição.
Realizou-se esta análise com o propósito de determinar as intervenções que o serviço deveria empreender para promover o aleitamento, a vigilância e o acompanhamento do crescimento. Cerca de 20 participantes reuniram-se em um seminário de 3 dias. Os integrantes do grupo procediam de diversos setores, ainda que o Ministério da Saúde estivesse melhor representado que os demais.
Na primeira fase da análise, os participantes concordaram em aceitar que os fatores que influem diretamente sobre o estado nutricional da criança de 0 a 5 anos são o consumo e a utilização biológica dos alimentos.
De acordo com esta decisão, os participantes analisaram esses dois fatores no primeiro nível.
Na Figura 1, aparece o ramo “consumo alimentar” da árvore dos fatores que influem sobre o estado nutricional das crianças de 0 a 5 anos.
A partir da análise da Figura 1, o grupo decidiu atuar sobre o fator aleitamento materno, cuja intervenção apareceu em ambos os ramos da árvore. Este fator foi objeto de um trabalho em subgrupos. Os resultados da análise causal sobre o início e a duração do aleitamento materno aparecem nas Figuras 2 e 3.

Para facilitar o trabalho do grupo, oferecem-se algumas regras para a construção do modelo de análise causal:

  1. A construção do modelo progride de cima para baixo, desde o efeito até a causa mais imediata.

  2. Cada fator dá origem a pelo menos outros dois no nível imediatamente inferior.

  3. Os ramos do modelo expandem-se sobre os distintos fatores: para a maioria deles, é possível gerar indicadores (por exemplo, a renda familiar); para outros, é muito difícil ou impossível gerar indicadores (por exemplo, o apoio familiar).

  4. Não se deve poupar esforços para identificar cada fator intermediário entre dois elementos na mesma cadeia causal.

  5. A interação entre dois fatores situados na mesma linha horizontal não aparece representada.

  6. Quando um fator aparece em distintas áreas do modelo, deve-se repetir o fator ao invés de desenhar conexões laterais.

  7. Os círculos de retroatividade (a causa convertida em efeito e vice-versa), não podem ser mostrados nesse modelo.

  8. Os participantes dessa análise decidem antecipadamente o nível no qual irão trabalhar, conforme se considere o problema em nível individual ou coletivo.

  9. Os participantes devem chegar a um acordo entre o rigor e a inclusão de todos os fatores possíveis no modelo, de uma parte, e a simplicidade e economia, de outra.

  10. Os participantes deverão estar de acordo sobre quando terminar o trabalho no modelo.

4.2. Como identificar as condutas que poderiam ser abordadas com uma intervenção?

Habitualmente existe uma estreita relação entre a conduta humana e a nutrição, tanto se o comportamento está ligado à produção, à conservação ou ao consumo de alimentos, como à saúde individual. Por esta razão, seja qual for o tipo de intervenção pelo qual se decida, é importante que o grupo considere a necessidade de incluir um componente educativo. Assim, a comunicação serve como estratégia básica para programas integrados.

A etapa de maior interesse para os comunicadores é a identificação das condutas vinculadas aos fatores que constituem o objeto da intervenção. Green et al. a denominam “diagnóstico de conduta”.

Em todos os casos, o grupo encarregado da análise causal deve dispensar atenção especial às causas vinculadas com essa conduta. Somente esses fatores poderão ser tratados com uma intervenção educativa.

Em certos casos, somente os fatores de conduta serão objeto da intervenção nutricional. Determinados projetos desenvolvidos de acordo com os princípios do marketing social, têm mostrado que é possível influir favoravelmente sobre o estado nutricional das crianças por meio de programas educativos dirigidos a seus pais.

No trabalho desenvolvido em Marrocos, a prática do aleitamento materno foi objeto de uma análise complementar realizada pelo mesmo grupo de trabalho. Como será visto mais adiante, essa segunda fase da análise permite a identificação dos fatores que influem na conduta do aleitamento em Marrocos.

O aleitamento materno inclui dois componentes: início do aleitamento (indicadores: se o aleitamento materno foi ou não iniciado e o intervalo de tempo entre o nascimento e o início do aleitamento); e a duração do aleitamento materno (indicadores: duração do aleitamento materno exclusivo e duração do aleitamento materno suplementado).
Mostra-se um exemplo nas figuras 2 e 3.

Figura 1
Modelo de análise causal do estado nutricional

Figura 1

Figura 2
Exemplo de um modelo causal sobre o aleitamento materno: diferentes causas que determinam o início do aleitamento materno

Figura 2

Figura 3
Exemplo de um modelo causal sobre o aleitamento materno: diferentes causas que determinam a duração do aleitamento

Figura 3

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