FAO no Brasil

Ajudando os agricultores a consolidar a paz

Louai Beshara
08/08/2018
  • Nova política da FAO reforça o foco na segurança alimentar e nos sistemas alimentares para ajudar a sustentar a paz

Roma - As guerras civis e os conflitos aumentaram acentuadamente na última década, levando à recente inversão de uma tendência de redução da fome global que já era constante.

Os conflitos causam maior impacto sobre as comunidades rurais envolvidas na agricultura. A produção de trigo na Síria caiu 40% e a produção de alimentos processados ​​no Iraque sofreu um declínio de dois dígitos. Na guerra civil de Serra Leoa, nos anos 1990, 70% da criação de rebanhos bovinos foi destruída e a produção de óleo de palma e arroz caiu mais de 25%. No Burundi, pesquisas mostraram que a exposição de um indivíduo à violência tornou-o quase um quinto menos propenso a cultivar café, mesmo quatro anos após o fim da guerra.

Em termos econômicos, as perdas agrícolas devido a conflitos ultrapassam notavelmente a assistência internacional ao desenvolvimento. Mais dramaticamente, o impacto múltiplo dos conflitos - incluindo pessoas deslocadas à força e crianças desnutridas - afeta o desenvolvimento nos lugares que mais precisam deles. Cerca de 75% das crianças com atraso no mundo vivem em países afetados por conflitos e estima-se que 87% de todas as pessoas que vivem em extrema pobreza também vivem em países ambientalmente vulneráveis ​​e frágeis.

A agricultura e os sistemas alimentares são notavelmente resistentes, mas como o diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), José Graziano da Silva, disse ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, "quando esses sistemas estão perdidos, é quase impossível reconstruí-los".

Em resposta a esses desafios, a FAO desenvolveu uma nova Estrutura Coorporativa para apoiar a paz sustentável no contexto da Agenda 2030, permitindo que a agência transforme seus compromissos em situações de conflito em abordagens deliberadamente focadas, estratégicas e baseadas em evidências voltadas para o apoio à paz sustentável.

Em síntese, ela orienta a FAO a elaborar suas intervenções de maneira sensível ao conflito, que pode contribuir para a prevenção do surto, da escalada, da continuação e - principalmente - da recorrência de conflitos.

A Organização está empenhada em trabalhar "em, dentro e através de" conflitos. Como delineado na nova Estrutura Coorporativa, esta abordagem compreende, respectivamente, ações para minimizar, evitar e resolver conflitos onde os recursos alimentares, agrícolas e naturais podem ser condutores; salvando vidas, protegendo sistemas alimentares e ativos produtivos e construindo resiliência em meio a conflitos. Buscando sempre promover o desenvolvimento sustentável, incluindo a redução da pobreza e a gestão de recursos naturais de maneira sensível ao longo de um ciclo de conflito.

Mantendo as fazendas fora da luta

Em uma época na qual os conflitos por recursos naturais - incluindo terra e água - são cada vez mais frequentes, é importante notar que a agricultura é uma arena que pode ser, como citado no projeto, "uma fonte de paz ou conflito, de crise ou recuperação, de tragédia ou cura ".

A FAO ajuda as comunidades rurais a lidar com conflitos, promovendo abordagens participativas para fortalecer a posse da terra na sequência de guerras civis em países como Angola, Costa do Marfim, Moçambique e, agora, na Colômbia. Os projetos agrícolas ajudam também a reintegrar ex-combatentes, como parte dos programas de desarmamento, desmobilização e reintegração na República Democrática do Congo, em Uganda e nas Filipinas.

Trabalhando frequentemente com organizações parceiras da ONU, a FAO está contribuindo para sustentar a paz no Afeganistão, na Bacia do Lago Chade, Mianmar, Somália, Sudão do Sul, Sudão, Síria, Ucrânia e Iêmen, entre outros - todos os principais pontos de conflito atualmente. Esse trabalho consiste em ajudar a criar sistemas de laticínios, fornecendo sementes e insumos agrícolas, planejando esquemas de proteção social sensíveis a riscos e até mesmo apoiando acordos de paz locais para permitir que programas de vacinação de gado continuem - uma especialidade da FAO que produziu resultados históricos, incluindo eliminação da peste bovina em um momento de conflito armado em toda a África Oriental.

Um tema comum é apoiar os países a manter a produção de alimentos, mesmo nos piores momentos.

Outra área de vantagem comparativa excepcionalmente forte para a FAO está nos sistemas de alerta antecipado, incluindo avaliações de segurança de sementes, medição de forragem pastoral, monitoramento de preços de mercado e alimentos, Classificação Integrada da Segurança Alimentar (IPC) e Modelo de Análise e Medição do Índice de Resiliência (RIMA) , os boletins trimestrais da Early Chain Warning, bem como numerosas redes de parcerias locais, como o programa de resiliência à seca com IGAD, para apoiar os pastores na África Oriental.

Estes têm um papel claro a desempenhar em estratégias de reforçar da segurança alimentar, com vista a antecipar potenciais conflitos, aplacar o custo humanitário dos que estão em curso e reduzir o risco de reincidência de conflitos quando a paz estiver acordada.

Como a agricultura é, atualmente, o principal setor econômico na maioria dos estados afetados por conflitos, com importância que transpassa os fundamentos da segurança alimentar, ela pode ser um motor de estabilização e recuperação, contribuindo para o tecido de confiança social.