FAO in Portugal

A fome persiste em áreas de conflito crónico, apesar das boas colheitas mundiais

10/03/2017

As emergências ligadas à Segurança Alimentar deverão aumentar

Lisboa - As condições globais de abastecimento alimentar são abundantes, porém o acesso aos alimentos tem sido dramaticamente reduzido em áreas envolvidas em conflitos civis, e as condições de seca pioram a segurança alimentar em toda a África Oriental, de acordo com a nova edição do relatório Crop Prospects and Food Situation da FAO. 

Cerca de 37 países necessitam de assistência externa para alimentação, 28 dos quais em África como resultado dos efeitos persistentes das secas provocadas pelo El Niño no ano passado nas colheitas em 2016. Embora se espere que a produção agrícola recupere na África Austral, as lutas prolongadas e agitações aumentam as fileiras dos deslocados e famintos em outras partes do mundo.

A fome foi formalmente declarada no Sudão do Sul e a situação de segurança alimentar é um motivo de grande preocupação no norte da Nigéria, Somália e Iémen.

"Esta é uma situação sem precedentes. Nunca antes tivemos de enfrentar 4 ameaças de fome em vários países ao mesmo tempo ", disse o Diretor-Geral Adjunto da FAO, Kostas Stamoulis, chefe do Departamento de Desenvolvimento Económico e Social. "Exige-se uma ação rápida que deve consistir em assistência alimentar imediata, mas também no apoio de meios de subsistência para garantir que tais situações não sejam repetidas".

No Sudão do Sul, 100,000 pessoas enfrentam a fome nas províncias de Leer e Mayendt, parte do antigo Estado Unidade, sabendo que havia um “elevado risco” de condições similares existirem em duas províncias próximas. No total, cerca de 4.9 milhões de pessoas em todo o país foram classificados em situação de crise, emergência ou fome. Prevê-se que este número aumente para 5.5 milhões, ou cerca de metade da população nacional, no pico da estação de escassez em Julho.

No norte da Nigéria, 8.1 milhões de pessoas sofrem de condições de insegurança alimentar aguda e necessitam duma resposta urgente que visa salvar vidas e de proteção dos meios de subsistência. Apesar das culturas de cereais acima da média em 2016, esta situação não poderia ser evitada e pode ser explicada pela perturbação causada pelo conflito e a forte desvalorização da moeda local.

No Iémen, estima-se que 17 milhões de pessoas ou dois terços da população sofram de insegurança alimentar, enquanto aproximadamente metade necessite de assistência de emergência, com o relatório frisando que “a declaração de risco de fome no país é bastante alta.”

Na Somália, a combinação de conflito, insegurança civil e seca, resultou em mais do dobro de número de pessoas - agora aproximadamente 2.9 milhões - a sofrerem de insegurança alimentar comparando com os 6 meses atrás. A seca reduziu a forragem para os pastores e espera-se que o terceiro ano consecutivo de fraca precipitação tenha reduzido a produção agrícola na região do sul e do centro, até 70 por cento abaixo dos níveis médios, deixando as reservas alimentares escassas.

Conflitos e instabilidade civil no Afeganistão, Burundi, República Central Africana, República Democrática do Congo, Iraque, Myanmar e Síria estão a piorar as condições de insegurança alimentar de milhões de pessoas e também afetar países vizinhos que recebem os refugiados. Além disso, a seca na África Oriental no final de 2016 tem aumentado a insegurança alimentar em vários países na sub-região.

Tendência Mundial

A nível mundial, em 2016, a produção de cereais registou um aumento acentuado, com um recorde de recuperação na América Central, e aumento de culturas de cereais na Ásia, Europa e América do Norte.

Com uma perspetiva do futuro, a primeira previsão da FAO da produção global de trigo para 2017 aponta para um declínio de 1.8 por cento em relação ao recorde do ano passado, devido maioritariamente às previsões de um declínio na produção de 20 por cento nos Estados Unidos da América, onde a área semeada com trigo de inverno é a mais baixa dos últimos 100 anos.

As perspetivas são favoráveis para 2017 no que refere à cultura de milho no Brasil e Argentina e o cenário é em geral positivo para os cereais secundários em todo o Hemisfério Sul. As perspetivas para o arroz são variáveis, mas ainda é demasiado cedo para afirmar previsões para muitas das principais culturas de cereais do mundo.

Para este ano, está prevista uma recuperação das colheitas de milho na África Austral, afetadas pelo El Niño, com a produção da África do Sul a aumentar em mais de 50 por cento em relação a 2016, provavelmente devido às tendências positivas em países vizinhos. Contudo, um surto de lagarta militar, juntamente com inundações localizadas em Moçambique, Zambia e Zimbabwe, poderá limitar maiores produções em 2017.

Os atuais 37 países em necessidade de assistência externa de alimentos são o Afeganistão, Burkina Faso, Burundi, Camarões, República Centro-Africana, Congo, Coreia do Norte, Djibouti, Eritreia, Etiópia, Guiné, Haiti, Lesoto, Libéria, Madagáscar, Malawi, Mali, Mauritânia, Moçambique, Mianmar, Níger, Nigéria, Paquistão, Serra Leoa, Somália, Sudão do Sul, Sudão, Suazilândia, Síria, Uganda, Iémen e Zimbabué.

Foto: ©FAO/Lieke Visser

Legenda: Jovens rapazes a regressar a casa após um dia de pesca nos pântanos de Nydal, Sudão do Sul