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ANEXO 8

Discurso principal
Prof. Edward S. Ayensu
Presidente do Conselho de Pesquisa Científica e Industrial (CSIR), Gana

Ilustres Delegados,
Senhoras e senhores,

Gostaria de aproveitar esta oportunidade para expressar meus sinceros agradecimentos ao comitê organizador por ter me convidado para pronunciar o discurso principal nesta Conferência Regional sobre Inocuidade dos Alimentos na África, com o tema ”Ações práticas para promover a inocuidade dos alimentos“.

A importância dos alimentos vai além de ser a principal fonte de energia e nutrição. Os alimentos também desempenham o papel invejável de ser uma ferramenta estratégica para manter nossa saúde, proporcionar a segurança de nossa subsistência e manter a própria sobrevivência da raça humana. Por isso, o mundo não está mais interessado apenas no volume de alimentos produzidos e consumidos, mas também, e mais importante, na qualidade dos alimentos fornecidos aos consumidores.

Essa demanda de alimentos saudáveis levou os pesquisadores científicos a investigar e aprofundar nosso conhecimento dos insumos, produção, manuseio e destinação final dos alimentos, e os possíveis riscos que podem representar para o consumidor. Todos sabemos que certas etapas na cadeia alimentar são cruciais para assegurar alimentos saudáveis na mesa de cada consumidor.

Por exemplo, o insatisfatório manuseio pós-colheita de grãos em muitos países africanos, especialmente aqueles que experimentam contínuas condições climáticas quentes e úmidas, tem sido responsável pela alta incidência de contaminação por aflatoxinas de grande quantidade de alimentos produzidos na região. Estudos indicam que na África a incidência de câncer do fígado apresenta a mesma distribuição geográfica da contaminação de alimentos por aflatoxinas. Além disso, esses e outros dados mostram de maneira conclusiva que as aflatoxinas podem provocar câncer no homem. Esses resultados devem representar grande preocupação para todos os governos africanos e seus amigos porque os grãos constituem um importante gênero alimentício para a população da região.

Portanto, é imperativo que a África disponha da capacidade necessária para assegurar que um volume suficiente de alimentos saudáveis esteja disponível aos consumidores. Trata-se de uma responsabilidade que os governos e o setor privado de nossos países não podem delegar a outros. A razão é que os alimentos saudáveis são a chave para a segurança da nossa subsistência. Falando francamente, chegou a hora de instar nossos governos a assumirem plena responsabilidade pela proteção dos consumidores, em vez de deixar essa questão nas mãos dos doadores tradicionais e instituições financeiras internacionais.

Contudo, observo com satisfação que essas questões serão deliberadas neste conferência.

Também é reconfortante observar que vários países africanos estão envidando esforços louváveis para implantar as instituições e medidas reguladoras necessárias para promover e assegurar a confiança dos consumidores na cadeia de produção de alimentos. Em meu país, Gana, por exemplo, a Junta de Alimentos e Medicamentos (FDB), a Junta de Normas de Gana (GSB), os Ministérios da Saúde, Alimentação e Agricultura, Pesca, Meio Ambiente e Ciência, e Turismo, para mencionar apenas alguns, estão participando ativamente de uma maneira ou de outra na vigilância e monitoração dos regulamentos de inocuidade dos alimentos no país. Outros países também têm envidado muitos esforços para melhorar a coordenação de seus sistemas nacionais de controle de alimentos. Por exemplo, Marrocos instituiu um Comitê Interministerial Permanente de Controle de Alimentos.

Portanto, é um bom sinal que os governos africanos estejam cada vez mais conscientes de que as questões de inocuidade dos alimentos são multissetoriais. Mas ainda é preciso incentivar os órgãos nacionais de inocuidade dos alimentos a se tornarem mais ativos na promoção e aplicação do conceito de Análise de Riscos e Pontos Críticos de Controle (HACCP). Temos que encontrar maneiras criativas na identificação, controle rigoroso e monitoração dos pontos mais críticos de possível contaminação no contexto africano, que é caracterizado por muitos e dispersos produtores e manuseadores de alimentos. Obviamente, não podemos assegurar a inocuidade de alimentos sem lidar holisticamente com as preocupações dos principais atores da indústria alimentar. Por exemplo, não se pode esperar que nossos agricultores, com o conhecimento de que dispõem atualmente, aceitem prontamente e cumpram voluntariamente todos os regulamentos sobre manuseio e aplicação de produtos químicos em suas plantações.

Portanto, é absolutamente essencial formular uma política para que todas as partes interessadas na cadeia alimentar dividam a responsabilidade por alimentos inócuos, aptos para consumo, nutritivos e saudáveis para toda a nossa população. Essa política asseguraria que os agricultores sejam treinados para se tornarem versados nas regras de aplicação de produtos químicos em seus campos, e que outros agentes nos pontos sucessivos da cadeia de manuseio de produtos estejam equipados com as habilidades necessárias para identificar e manusear os diversos tipos de contaminação química e microbiológica.

Além disso, os governos africanos devem implantar programas nacionais de monitoração que proporcionem dados exatos sobre os níveis e tendências da contaminação de alimentos. Esses programas de monitoração podem ser usados como base para instituir regulamentos preventivos. Trata-se de uma das maneiras mais seguras de impedir a venda de alimentos contaminados ao público.

Todas essas medidas não darão muito resultado sem uma extensa educação pública. A necessidade de conscientizar os consumidores em escala maciça é não só desejável, mas crucial. Observo com satisfação que várias ONGs em nossos países passaram a defender a proteção do consumidor, porque perceberam que os consumidores estão se tornando vulneráveis aos instintos comerciais dos distribuidores e importadores de alimentos locais e estrangeiros. Infelizmente, alguns importadores de alimentos e seus distribuidores locais não se importam de colocar no mercado alimentos com a validade expirada que em muitos casos não são apropriados para consumo humano.

É gratificante observar que os países da região, ao planejar esta conferência, indicaram nos objetivos que em seus cálculos dão grande valor à questão da conscientização do consumidor. Na verdade, é preciso envidar todos os esforços e encontrar soluções práticas para criar e fortalecer a conscientização dos consumidores em nossos países tão logo seja possível. A solução de alguns dos inúmeros problemas da África, inclusive a provisão de alimentos saudáveis para a população e para exportação, dependerá em grande medida da conscientização dos consumidores acerca da inocuidade dos alimentos.

A crescente globalização do comércio de alimentos resultou em mudanças nos padrões de consumo, novos métodos e tecnologias de produção, transferência transfronteiriça mais rápida de riscos microbiológicos e químicos na região. Precisamos sem demora desenvolver a capacidade humana, legal e material para lidar com essas ameaças, bem como o surto de novas doenças animais como a doença da vaca louca e a gripe aviária que está ocorrendo em alguns países e também afeta o abastecimento de alimentos.

Nesse sentido, também é importante que a África enfrente a questão dos alimentos geneticamente modificados de maneira pragmática, e não apenas com emoções, já que a engenharia biotecnológica se tornou uma proposição científica realista para aumentar a produtividade agrícola, melhorar a resistência das lavouras a ataques de insetos e doenças e melhorar a qualidade dos alimentos. São perspectivas muito atraentes para que a África considere ao tentar responder ao difícil desafio de proporcionar uma quantidade suficiente de alimentos saudáveis para a população.

Contudo, não podemos nos esquecer de que, por mais atraentes que sejam esses avanços científicos, foram levantadas sérias preocupações a respeito da preservação da biodiversidade, biosegurança e inocuidade dos alimentos no longo prazo. Os cientistas africanos não podem permanecer passivos ou despreocupados enquanto o resto do mundo busca novas idéias que levem à criação do quadro institucional adequado e salvaguardas reguladoras para a inocuidade dos alimentos. Devemos participar ativamente da vanguarda da pesquisa científica e tecnológica realizada em outros países.

A África deve começar a se afirmar com base em fatos cientificamente justificáveis para que não se transforme num “depósito” não só de alimentos insalubres, mas também de idéias sem valor. Tenho certeza de que esta conferência será mais que capaz de abordar algumas das intervenções cruciais para assegurar que os alimentos, produzidos localmente ou importados, cumpram as normas internacionais geralmente aceitas de inocuidade dos alimentos.

Gostaria de aproveitar esta oportunidade para instar os países africanos a olharem além de suas fronteiras e começar a examinar maneiras e meios de colaboração com outros países da região, com organizações internacionais, públicas e privadas, e com as organizações da sociedade civil, para harmonizar suas políticas e quadros normativos.

Os governos africanos devem assumir o papel de liderança nessa questão. Não devemos ficar passivos! Na verdade, não devemos desanimar face às enormes dificuldades que temos pela frente. É muito possível que, se os governos africanos vocalizarem as terríveis estatísticas de nossa população exposta a alimentos insalubres e os conseqüentes problemas desnecessários de saúde, poderemos incentivar as agências doadoras, que estão perdendo coragem face aos numerosos problemas da África, a reacender seu espírito de cooperação e programas de assistência ao desenvolvimento.

Finalmente, gostaria de reconhecer o fato de que sempre nos beneficiamos muito do apoio e assistência de organismos das Nações Unidas, como a FAO e a OMS, especialmente na área de inocuidade dos alimentos. Estou certo de que poderemos continuar contando com eles nos próximosanos.

Obrigado pela atenção e desejo que a conferência seja muito bem-sucedida.


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